A esquina da Rua Benjamin Constant com a Rua Ipiranga, local central na cidade, próximo à Rodoviária, e no trajeto principal para o bairro da Paulista guardou por um grande período uma dinâmica própria, mantida pela família Adâmoli.
Nesta esquina estavam, num dos lotes a fábrica de barcos, com a bomba de gasolina na calçada, conhecida daqueles que enveredavam pelo Rio Piracicaba e que recorriam ao local para ter suas embarcações, e em outro lote, em diagonal à oficina de barcos, a residência sólida, bem construída, de parte da família Adâmoli, onde moravam a matriarca e seus filhos, entre eles o pintor Joca Adâmoli.
Também outros membros da família Adâmoli, ligados a fabrica de barcos moravam nas imediações dessa esquina, formando um núcleo conhecido primeiramente por seu ofício na lida da madeira, transormando-a em embarcações, e num outro momento pela obra do artista plástico Joca Adâmoli.
O pintor, que parece nunca ter saído do município (salvo raras exceções), caseiro, com seu ateliê na casa que se mantém até hoje, construiu uma obra que evoluiu para o que chamamos de linguagem universal. Através do tratamento plástico dado aos horizontes de Piracicaba, nos seus arredores, nos bairros do Saibreiro, Ondinhas, nas vistas do Rio Piracicaba, conseguiu chegar a um tratamento tão requintado de forma e cor, que ultrapassou as fronteiras do município e do país para ter obras em importantes acervos e edições de arte.
A importância do tombamento desta casa, onde ele viveu e produziu toda sua obra deve-se mais, no meu entender, aos abrigos que ela propiciou do que a sua estética propriamente dita. Mesmo assim, a forma do edifício, da primeira metade do século XX, obedece a um padrão bastante recorrente, com o piso da residência um pouco acima do terreno, dando-lhe maior conforto térmico e liberando-a de qualquer umidade vinda do solo. Os recuos laterais permitindo uma excelente insolação, as janelas todas abrindo para a rua (uma esquina) os adornos de fachada, bastante destacados pela ausência do beiral, conferem-lhe imponência.
O edifício residencial mantém suas características, da época da construção e de uso, com poucas interferências, como um acréscimo de gradil, inadequado, feito junto ao portão principal de acesso. Pequenos restauros na pintura da casa a deixariam apta a abrigar qualquer das atividades que se enseje para a área central da cidade.
Acredito que o nome do pintor Joca Adâmoli seja reconhecido e lembrado pelos piracicabanos. Um homem de trajetória simples, tão limitada em termos de locomoção espacial e tão abrangente, tão motivadora em termos de expectativa de arte. Eu perguntaria ainda, ao Eduardo Grosso, hoje um pintor ativo, em plena exuberância, se a obra de Adâmoli foi importante na construção de sua própria linguagem.
Piracicaba, 02 de julho de 2008
Renata Toledo Leme
Arquiteta
Publicado no Jornal de Piracicaba.